A Madre Teresa do Brasil

[pullquote]Doar anonimamente, como rezam todas as religiões, nem pensar.[/pullquote]

 

 

 

 

 

 

 

Eu conheço uma verdadeira santa. Não é todo mundo que tem esse privilégio.

Vou contar como a conheci para que todos façam o mesmo e descubram outras santas escondidas por aí.

Trinta anos atrás, criei um prêmio para as melhores empresas do país, o Melhores e Maiores.

Depois de 25 anos, percebi que estava dando prêmios para as pessoas erradas. Empresários já tem o seu prêmio, que é o lucro no final do ano.

Entidades Beneficente não tem lucro, e nem tampouco tem um Prêmio tipo Melhores e Maiores para festejar o sucesso que merecem.

Decidi então criar o Prêmio Bem Eficiente, para entidades beneficentes.

No meu trabalho de visitar uma a uma, Alice Carta levou-me para conhecer uma entidade super séria, e quando cheguei lá ouvi a palavra lepra (hanseníase).

Fiquei em pânico, queria sair dali o mais rápido possível. Onde fui me meter.

Foi quando a vi pela primeira vez.

Era uma religiosa de 81 anos, que há 49 veio jovem da Itália para cuidar dos hansenianos do Brasil. Perdeu 9 quilos na viagem e ainda se esqueceram de buscá-la quando desceu do navio.

Na época, existia uma lei de confinamento para as pessoas portadoras desse mal – todas eram obrigatoriamente enclausuradas num asilo, em Guarulhos.

Era uma prisão perpétua, e ninguém queria cuidar deles, nem amigos nem parentes, com exceção da irmã Lina.

Não dando importância ao fato de que provavelmente também contrairia a doença, ela viveu ali cuidando de mais de 1.000 hansenianos, onde ficou nada menos que trinta anos se dedicando a eles.

A história não pára por aí.

Com os avanços da medicina da época, o mal foi quase erradicado, e isso permitiu que a irmã Lina mudasse de preocupação (o problema ainda é grave em algumas regiões do país).

Então, ela criou uma creche para os filhos de hansenianos e dedicou-se a eles por mais dezenove anos, até ficarem adultos.

Não satisfeita, ela tem uma entidade que cuida de 500 crianças abandonadas, uma das mais eficientes que já vi.

As crianças são felizes, têm uma autoestima que raramente vejo nas escolas de bairro.

Tive o privilégio de conferir, por duas vezes, o Prêmio Bem Eficiente à sua instituição, e ela esteve lá novamente na entrega do prêmio no dia 14 de maio.

Mas isso não é mais notícia.

Hoje, a grande moda é premiar empresas socialmente responsáveis, e não entidades que há muito vêm fazendo o bem sem alarde. Já existem dez prêmios para empresas com nomes como A Empresa Cidadã, A Empresa Social, A Empresa Responsável.

Antigamente, marketing social era o que as entidades faziam para aparecer.

Agora, significa tornar empresas socialmente visíveis a todo custo.

Doar anonimamente, como rezam todas as religiões, nem pensar.

A filantropia por parte de empresas vem caindo ano a ano, porque muitas preferem montar o próprio instituto com o nome da marca da empresa.

Em vez de uma Fundação Bill Gates, no Brasil privilegiam-se a “marca” e o marketing da empresa.

Tanto é que o Prêmio Bem Eficiente morreu, as empresas achavam que meu prêmio estava fazendo as Entidades Famosos, quando quem deveria ficar famosas eram as empresas. A Natura foi a primeira empresas a desistir do Prêmio Bem Eficiente, as outras logo seguiram atrás.

Não vou dar o nome de sua instituição, da Irmã Lina, seu endereço nem seu nome completo, porque quero que todos saiam e procurem os milhares de santas que ainda temos por aí, desconhecidas, esquecidas e cada vez mais abandonadas.

Mesmo porque Irmã Lina morreu, e ninguém noticiou. Sua instituição praticamente fechou e ninguém protestou. O Prêmio Bem Eficiente morreu e ninguém mais sabe quais são as melhores entidades deste país. A responsabilidade social declinou e as agências de propaganda e as empresas privilegiam a responsabilidade ambiental.

Fica aqui o nosso singelo agradecimento.

Obrigado a todas às irmãs Linas por tudo o que fazem por este país.

12 Comments on A Madre Teresa do Brasil

  1. fiquei sem palavras agora, você está certo ,não somente encontrar mas ajudar de alguma forma.triste por saber que não deram continuidade ao trabalho dela.Parabéns por sua iniciativa.
    Leila Alencar

  2. Estou realmente comovido. Tenho esta visão que VC demonstrou neste seu “depoimento”, mas é difícil demais. Você foi muito forte em sustentar por alguns anos esta premiação. É difícil ser solidário, as pessoas são “encostadas” no seu meio social, e aí fica difícil porque precisamos também viver entre os nossos. Na propria familia criticas e criticas pela “perda de tempo” etc.
    Aquí no interior de São Paulo, existem hoje movimentos sérios, realmente fazendo bom trabalhos, mas presididos por notáveis onde a imprensa não se cansa de agradecê-los.
    Não se pode prescindir deles, temos realmente que agradecê-los, mas premiar e reconhecer trabalho de anônimos…pra que?
    Kanitz te amo!!!

  3. Está lá escrito, pode procurar, sobre aqueles que recebem sua glória aqui e os que recebem sua glória no porvir. Ao contrário do que pensam, o céu é uma entidade fechada, suficiente, que ri da sabedoria humana. Há retornos que não podem se contabilizados. Não há contabilidade que consiga aferir tais dividendos, então, estes simplesmente ignoram o mundo, sorriem por dentro e aguardam o dia de realizar seus lucros. A vida passa rápido, para que estressar?

  4. Infelizmente esta é a conduta que muitos brasileiros estão se deixando contaminar, influenciados por uma REVOLUÇÃO INVISÍVEL, que está destruindo os alicerces de uma sociedade, baseados na religião, na cultura e na moral.
    No Estado de Rondônia vi com meus olhos um trabalho semelhante a este, promovido pelas IRMÃS MARCELINAS que por sinal faço questão de citar a instituição, que vem se mantendo a duras penas e poucos ou quase ninguém divulga um trabalho tão edificante do ser humando.

  5. Caro Kanitz,
    fiquei emocionada com seu post. Nós, que atuamos no terceiro setor, além de não sermos reconhecidos, ainda temos que ver gente como esse Wasabi confundindo as bolas e se deixando levar pela mídia comprada.
    Para seu governo, Wasabi, vc acabou de citar fundações criadas por partidos para lavarem seu dinheiro. Partidos políticos também são organizações “sem fins lucrativos” e deve-se aprender a separar o joio do trigo. Existem hoje milhares de organizações no país que lutam diariamente pelo bem estar social – SOZINHAS! São pessoas que abrem mão de tudo para ajudar o próximo, como no caso da irmã citada por Kanitz. Conheço vários exemplos, principalmente de organizações que atuam no interior, sem qualquer apoio financeiro ou de gestão, de gente inclusive analfabeta (de gramática, pq são doutores na moral, na ética e no amor) que criaram entidades por serem solidários ao sofrimento do próximo.
    Espero que isso mude um dia Kanitz. Muitas organizações acabam morrendo com seu fundador pelas razões que vc citou. Parabéns pelo texto e por sua coragem. Quem dera tivéssemos mais pessoas de visão neste país. Não teríamos tanta indierença…
    “Eu só peço a Deus que a dor não me seja indiferente. Que a morte não me encontre um dia, Solitário sem ter feito o que eu queria…”
    Abraço,
    Adriana

  6. Kanitz,
    Vivemos num mundo Extremamente Consumista, os Verdadeiros Valores estão na Gaveta. As empresas destroem a natureza e se dizem “SUSTENTÁVEIS”, vendem essa imagem e continuam destruindo. O que precisa de SUTENTABILIDADE É O SER HUMANO, que está cada vez mais vazio e perdido, porque só cuida do material e não entende que sem Deus não é nada, e Deus é Amor e Amar é se importar com o seu Semelhante.

  7. Caro Professor
    Saudações
    Obrigado por trazer a luz onde reina as trevas.
    Este texto de profundo valor moral e sério para uma
    sociedade. Dar sem nada receber em troca é a grande dificuldade humana. A matéria prevalece sobre o espírito no mundo atual, sendo que o contrário que deve ser exaltado. A doação discreta com a mão direita, para que a esquerda não saiba e com isso divulgue está reclusa em poucas instituições religiosas ou não. Espero que os educadores, hoje escassos e mal remunerados, ensinem as gerações vindouras a importancia do trabalho beneficente desprendido de interesses comerciais e sim vejam no proximo a propria semelhança.
    Obrigado.

  8. Agradeço pela materia belissíma e pelo excelente protesto. Concordo quando vc fala que existe alguns santos e santas por aí porque conheço tbm um ou uns. Seria legal um dia ver nosso povo com essa consciência de quem realmente faz sem querer algo em troca e isso é muito divino é o que me faz ter esperança de que vale a pena continuar ter esperança de que um dia poderemos ser todos mais felizes e menos desiguais.

  9. Eu tive a felicidade de a Irmã Lina fazer parte de minha vida,sou uma ex – interna do colégio que ela fundou.O amor dela salvou a mim e minhas irmãs.
    Ela era um ser magnífico e sempre nos tratou com muito carinho e amor.Lembro-me que ela chamava a todos de filho,sem nenhuma diferença,seu amor era imenso…
    Eu sai do colégio em 2004 e desde então vinha buscando noticias da Irmã Lina que estava doente.
    Fiquei sabendo de sua morte e estou profundamente triste,pois,ela foi muito importante na vida de todos que moravam no colegio e tenho certeza de que perdemos uma pessoa abençoada e muito usada por Deus.
    Sua história de vida é linda e de completa doação ao próximo.

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